Afinal...



Não houve nada.
Nada mais que o olhar penetrante, que partiu conforme chegou.
Ainda bem.
Estava cheia de medo que me partisse algum pedaço da Concha que sou.
Lá se foi o olhar menino.
E a Concha está inteira.

Hoje vi uns olhos...

Há muito tempo que não via uns olhos assim.
Olharam-me de frente, sem medo, com segurança.

Sim, porque mesmo sendo uma concha menina, não há muitos olhos meninos que se prendam aos meus.

E os meus olhos de concha também ficaram ali presos, durante segundos. Eternos momentos.
Senti medo. E não sei porquê.

Esqueceste

Como é que pudeste esquecer?


Não basta um simples telefonema, uma chamada um bocado fria: vamos beber um café?
Sim, aceitei e à hora marcada, lá estava eu, com tudo o que trago sempre comigo - a vontade de te ver.
Bem pude esperar. Mais de meia hora e, de ti, nada.

Olhei para o telemóvel, não fosse tê-lo desligado. Mas não. Ligado e à tua espera.
Não disseste nada!Nada!
O que faz agora esta Concha, saída da areia da praia, de propósito para te ver?

Lembrei-me de ti

Foto de James Lohrey

Pois foi.
Relação terminada, não sei porquê (ou, se calhar até sei), hoje senti falta de ti.
Da segurança que tinha contigo.
Sobretudo, senti nostalgia, não foram saudades. Sempre estiveste lá para mim.

E só notei esta falta, quando, por alguma razão, me sinto só, estando acompanhada.
É a tal frase feita: só no meio da multidão.
Nostalgia de ti. Nostalgia daqueles tempos, juntos.
De qualquer forma, não voltaria a estar contigo da forma como já estivemos.
De Concha para Concho, isto não é uma declaração de amor, ok?
Talvez seja o reconhecimento - atrasado - da importância que tiveste na minha vida, da tua presença ao meu lado.
Tudo o que passa, já passou. Fica este reconhecimento.

Incongruências

Recebi esta por e-mail:

"Nunca um coxo treinou atletas para a maratona nem um mudo deu aulas de
dicção.
Só os padres não prescindem de dar conselhos sobre a reprodução e a
sexualidade!
"

Quero um Concho

Faz-me falta ter um Concho, um macho que me complete.
Sempre seria mais giro partilhar a minha vida com um Concho.

Mas, que raio! Vejo todo o tipo de conchos, aqui na areia. Muitos estão todos partidos, estraçalhados, magoados e eu que até sou uma Concha gira, pffff, nem me ligam. Só olham para o seu próprio sofrimento.

Quero também um Concho giro, amante, Concho macho, que me tire daqui e me leve a passear pelos oceanos.

E eu que já andei por tantos oceanos!!!


Agora estou aqui parada, sem concho que me abane, que me leve, que me faça enamorar.

o namorado da minha amiga


é uma sanguessuga.


Não quero que se interprete mal este desabafo de Concha do Mar, mas é uma forma de dizer. Uma forma de expressar.


Claro que o homem não a trata mal, pelo menos que eu veja. E ela também não se queixa.
Mas no meu canto, na areia da praia, vejo e sinto.
Aquele homem, com muitas dificuldades em reconhecer sentimentos e emoções, vive através das emoções dela. Ele sente, ele tem emoções e até reacções espontâneas e emotivas.
Mas, parece que, por si, se ela não existisse na vida dele, ele não agiria. Seria talvez uma concha até parecido comigo. Observando e não agindo.
Então, ela age por ele. Ela vive, ela sente. E ele vai de boleia e sente-se como ela: se ela estiver alegre, ele fica alegre. Se ela estiver mais triste, ele fica triste. Se ela ficar zangada, ele fica zangado. É como se aquele homem não tivesse personalidade própria. Baseia-se no sentir dela, para ele próprio sentir.

Era a isto a que me referia quando o considero uma "sanguessuga".

Parece que ele vive, não com ela, mas através dela.
Se é que isto é possível.

what????

Isto é possível?
É possível que um jornal publique isto???
É verdade comprovada por estatísticas, que uma percentagem de divórcios em Portugal se deva a supostos "videntes"???
Vivemos em épocas tribais? Nas cavernas?

Publicado no Correio da Manhã de 29 de Janeiro de 2007

hiato

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Surpreendi-me.
De repente, como se tivesse acordado, esta ideia passou-me pela cabeça: tenho um gato!
Claro que sei que tenho um gato, claro que o vejo todos os dias, que o toco, pego ao colo, claro que o alimento, o trato. Há anos.
Não foi tanto o facto de eu ter o meu gato, aos pés, sorrateiro; é que hoje, passou por mim um hiato temporal de nulidade. Faltaram-me anos durante milésimas de segundos. Perdi memórias recentes no espaço de dar um passo e ter o gato aos pés.
Eu tenho um gato!
Eu sei que tenho um gato! Não deixou de me ser estranha esta sensação de que, durante milésimas de segundo, não reconheci o animal que tinha aos meus pés e veio esta frase à minha cabeça: eu.tenho.um.gato.

Caída na areia

Sempre fui uma Concha, caída na areia da praia.
Nunca estive parada, porque mar me acariciava, me levava e trazia. Conheço histórias, vivo daquilo que vejo e tenho tantos relatos para contar.
Porque não começar a contar o que tenho visto; porque não dar a minha opinião?
Então, porque sim, aqui ficam os relatos de uma Concha a quem deram o nome de Orinocco.